Centenário da Primeira Aliança
No próximo mês de novembro o bairro da 1ª Aliança no Município de Mirandópolis, no Estado de São Paulo, estará comemorando o seu centenário de fundação. É um capítulo na imigração japonesa ao Brasil e possui peculiaridades que difere de outras imigrações japonesas.
Para conhecê-la é preciso retroceder ao Japão da época da restauração Meiji, quando o Japão sofreu transformações sócio econômicas profundas. Com a reforma agrária, a população jovem passou a migrar para as cidades, pois a terra da família ficava com o primogênito e aos demais membros, restava a alternativa de seguir para as cidades à procura de emprego.
Neste contexto, o pastor protestante da província de Miyagi, segue a Tóquio com o intuito de auxiliar jovens no acesso ao emprego e estudo no curso noturno. Funda uma entidade Nippon Rikkokai com essa finalidade, porém, percebe que é mais interessante fazer isso nos Estados Unidos, assim seguem àquele país, inclusive o jovem Shigueshi Nagata.
Na Rikkokai, os jovens aprendiam a língua, maneira de conviver em outros países e os estudos bíblicos. O Sr. Shimanuki com idade avançada, deixa a direção da Rikkokai e para isso, chama de volta o Sr. Shigueshi Nagata para assumir a direção da Entidade.
Os EUA passam a restringir a entrada de imigrantes e nessas circunstâncias o Sr. Nagata, como 2º presidente passa procurar outros países para o envio dos jovens, voltando suas vistas a América Central e Sul, sobretudo o Brasil.
Procura o governador da província de Nagano, Toshio Honma e cria a Associação Shinano Kyokai em 13 de maio de 1923. Ela resolve fundar uma colônia modelo na América do Sul para fixação de imigrantes, oferecendo-lhes apoio e segurança.
Ao senhor Tarama, então cônsul do Japão em Bauru foi dada a incumbência de procurar essas terras para colonização.
Shungoro Wako que se encontrava em Registro foi incumbido de procurar a terra. Percorreu o interior do Estado e escolheu a oeste do Estado, seguindo pela estrada de ferro noroeste, partindo de Araçatuba e que se interrompia na estação de Lussanvira na barranca do Rio Tietê. Deste local, por picada de 36 km no meio da mata escolheu as à margem do Córrego Cotovelo, no então município de Araçatuba, área que foi sugerida pelo cônsul Tarama.
Em 1924, o Sr. Nagata vem ao Brasil e em 1º de outubro formaliza a aquisição de 2.200 alqueires do Sr. Rodolfo Nogueira Miranda, passando esta área a se denominar Primeira Aliança.
Os senhores Shungoro Wako e Chikazo Kitahara são nomeados administradores do núcleo e os lotes de 10, 15 e 20 alqueires começam a ser vendidos para os associados da Shinano Kyokai.
Com o sucesso da empreitada a província de Tottori faz o mesmo tipo de empreendimento associando-se a Nagano originando-se a Segunda Aliança (1926). Posteriormente, a província de Toyama inicia o mesmo tipo de empreendimento associando-se tambem a Nagano, dando origem a Terceira Aliança (1928).
A ocupação das Alianças com algumas singularidades no contexto da imigração japonesa ao Brasil, difere das outras. Recebeu em torno de 1.420 imigrantes, a maioria após II Guerra. Eles vinham para ficar na terra, “enterrar seus ossos no Brasil”.
Os imigrantes recebiam preparação prévia antes da sua viagem, residiam nas dependências da Rikkokai onde estudavam os usos e costumes do Brasil, os rudimentos da língua portuguesa, além do estudo bíblico. Permaneciam internados por 3 a 6 meses. Para custear sua estada na Rikkokai, trabalhavam vendendo jornais, sabão, no assentamento de dormentes de estrada de ferro, e outras atividades. Numa dessas vendas, um estudante bateu as portas do banqueiro Akira Watanabe que. posteriormente adquiriu uma gleba de 200 alqueires, dando origem a Watanabe nôjo. Os recém chegados que não tinham o seu lote permaneciam alojados, trabalhando no plantio de café, até conseguir comprar o seu lote.
Entre os moradores das Alianças haviam pessoas que retornaram dos EUA, segundo tenente do exército; formados em horticultura da faculdade de Agricultura, burocrata da Casa Imperial, formado pela escola de comércio e indústria, com curso de pedagogia, chefe da agência de correio, major do exército e veterinário, engenheiro naval dos estaleiros formado em Universidade de Tóquio; poeta de tanka, jornalista, médico, empresário. O Sr. Tomoo Handa afirma que nenhum núcleo de colonização reunia tantos intelectuais como nas Alianças.
No aspecto cultural existiu o Instituto Kurihara, liderado pelo Sr. Shiniti Kamiya que fazia observações e anotações sistemáticas da luz zodiacal e estrelas cadentes. Estes estudos eram enviados à Universidade de Kyoto.
Uma comunidade surgida nas Alianças que existe até os dias atuais e é conhecida no Japão, é a comunidade Yuba, fundada pelo lendário Isamu Yuba, que se dedica a ballet, coral, escultura, outras atividades artísticas e beisebol.
As peculiaridades das Alianças são as divisões das glebas em lotes de 10 alqueires quase sempre com acesso a fonte de água.
Examinando-se o mapa das Alianças de 1938 consta a localização da respectiva sede, conhecida como patrimônio, onde o agricultor encontrava pequeno comércio, farmácia, escritório da cooperativa, escola primária, máquina de beneficiamento de arroz, algodão, serraria, entre outros equipamentos. A cooperativa administrava a vida econômica e social dos moradores.
Um esclarecimento importante para as pessoas que não conhecem as Alianças é que, no passado, elas tiveram acesso através da estrada de ferro noroeste do Brasil que saia de Bauru, chegando a Araçatuba e daqui a ferrovia margeando o rio Tietê chegava à estação de Lussanvira. Desta estação foi aberta a picada de 36 km na mata, dando origem a primeira Aliança. Por isso muitos não entendem a situação atual da designação da localização, km 50,13, 12, em sentido contrário. É que a ferrovia da época foi desativada e uma nova ferrovia foi construída a partir de Araçatuba seguindo a frente pioneira do café, denominada variante, que atinge o rio Paraná e segue pelo Estado de Mato Grosso do Sul, adentrando ao país vizinho Bolívia. O atual município de Mirandópolis foi criado posteriormente, englobando os bairros das Alianças.
*Artigo de Reimei Yoshioka que nasceu e morou na 3ª Aliança, estudou na 1ª Aliança e elaborou a tese de doutoramento na USP intitulada “Por que migramos do e para o Japão”. Consultou-se também o livro “Aliança A TERRA DA COOPEERAÇÃO” de Kai Kimura- Nikkei Shimbun