Seminário visa fortalecer e desenvolver relações comerciais e de cooperação entre o Japão e o Brasil
O Ministério da Agricultura, Florestas e Pescas do Japão (MAFF), em colaboração com a Jetro (Japan External Trade Organization) realizou, no dia 3 de fevereiro, nas dependências do Bunkyo – Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social –, no bairro da Liberdade, em São Paulo, o Seminário Brasil-Japão sobre Alimentos e Agricultura. O evento abordou a possibilidade de desenvolvimento dos negócios da indústria de alimentos japonesa no Brasil e a cooperação entre os dois países para segurança alimentar global e sistemas de produção sustentáveis.
Estiveram presentes no Seminário o embaixador do Japão no Brasil, Teiji Hayashi; o presidente do Bunkyo, Renato Ishikawa; o conselheiro do Ministério da Agricultura, Florestas e Pescas do Japão, Takashi Yoshioka; o ex-ministro da Agricultura do Brasil e coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getulio Vargas, Roberto Rodrigues; o diretor de Investimentos, Líder de Desenvolvimento de Negócios de Agronegócios, América Latina e Caribe, IFC (International Finance Corporation), Luiz Daniel de Campos; o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Japonesa no Brasil, Yuki Kodera; o diretor da Jetro São Paulo, Hiroshi Hara; o deputado federal Kim Kataguiri e o vereador Rodrigo Goulart, entre outros.
Degustação – O local contou também com um estande para reuniões de negócios e um espaço expositivo para apresentação dos produtos e tecnologias das empresas participantes. Os fabricantes de alimentos japoneses também puderam realizar demonstrações do preparo de ramen, além da exibição/degustação de alimentos processados e doces. Estiveram presentes representantes da Nishiyama Seimen; Associação dos Produtores de Kumamoto; Ajinomoto; Kameda Seika; Kajitani’s; Prefeitura de Ibaraki; Onisi Foods; e Reifa Japan.
Paralelamente, no segundo andar do Bunkyo, foi realizado o Projeto de Intercâmbio, Cooperação e Geração de Negócios dos Agricultores Nikkeis da América Latina 2022-2023 e 2ª Reunião de Fortalecimento dos Agricultores Nikkeis com representantes da Argentina, Paraguai, Bolívia, Peru, Colômbia e México, além do Brasil.
Treinamento – O conselheiro do Grupo de Regiões Emergentes do Ministério da Agricultura, Florestas e Pescas, responsável pela cooperação com a América Latina e outros países emergentes, Takashi Yoshioka, lembrou que a reunião de relatório sobre o programa de treinamento para agricultores descendentes de japoneses da América Latina, vem sendo implementado pelo Ministério há 30 anos. Segundo ele, este ano, depois de três anos, também foram realizadas visitas de treinamento presencial ao Japão.
Abertura – Na abertura do Seminário – que teve transmissão on-line (além do formato presencial) –, o embaixador Teiji Hayashi disse que “o mercado brasileiro é bastante atraente, considerando o consumo e a distribuição” e que o governo japonês japonês reconhece esse potencial.
“Sendo assim, nós da Embaixada, Consulado Geral e o Governo Japonês como um todo, pretendemos continuar trabalhando na promoção de produtos alimentícios japoneses no Brasil”, disse Hayashi, explicando que, “graças à dedicação dos japoneses, descendentes e todos da comunidade nipo-brasileira, a culinária japonesa tem se enraizado em diversas partes do Brasil já há anos, principalmente no bairro da Liberdade, em São Paulo”.
Fusão – “Tem até ingredientes tradicionais japoneses, como shoyu, missô e nihonshu, mais conhecido aqui como saquê, que são produzidos no Brasil. Pratos que surgiram da fusão com culinária de outros países, como lámen e curry japonês por exemplo, têm ganhado popularidade por todo o Brasil, com destaque em São Paulo”, disse, acrescentando que “por outro lado, olhando para o mercado japonês, a pandemia do novo coronavírus, a seca recorde na Europa e a invasão russa da Ucrânia resultaram no grande aumento de preços de muitos produtos importados, de alimentos e de vestuários”.
“À medida em que o mundo inteiro está aumentando o interesse pela segurança alimentar, o Governo do Japão está concentrando sua atenção no Brasil como um dos países mais importantes no fornecimento de alimentos para o mundo”, afirmou o embaixador.
Sustentável – Segundo o embaixador, o Japão importa 60% da carne de frango e 30% do café do Brasil. “Também importa muitos grãos como a soja e o milho brasileiros. Além disso, há possibilidade de que a demanda de exportação de soja brasileira não-OGM (livre de organismos geneticamente modificados) para o Japão aumente ainda mais no futuro”, disse Hayashi, lembrando que o projeto de cooperação técnica promovida pela Jica, ‘Collaborative Development Project for Precision and Digital Agriculture to Strenghten the Innovation Ecosystem and the Sustainability of Brazilian Agrifood Chains’ entrou em vigor a partir deste ano.
“Este projeto visa promover uma agricultura estável e sustentável de última geração no Brasil através da cooperação entre os governos japonês e brasileiro no campo da agricultura de precisão e digital, que também deve contribuir para a segurança alimentar do mundo todo”, explicou.
Centros de Excelência – Já Renato Ishikawa destacou que, para o Bunkyo – principal entidade representativa da comunidade nipo-brasileira – acolher o tema proposto pelo seminário “faz parte do escopo da nossa entidade”. “Certamente nesse cenário de preocupação global com a segurança alimentar, sustentabilidade e busca de alternativas estratégicas, ganha relevância a trajetória dos imigrantes japoneses e seus descendentes. Os imigrantes, a partir do trabalho nos cafezais paulistas no início do século 20, ao longo do tempo intensificaram a sua produção agrícola bem como suas ocupações profissionais em todas as atividades, sendo reconhecidos por sua seriedade, competência e qualidade”, afirmou o presidente do Bunkyo, afirmando que “merece destacar que os nipo-brasileiros continuam exercendo papel relevante no setor do agrobusiness não só no Estado de São Paulo como também em todo país, com vários Centros de Excelência econômica dedicadas ao cultivo e aprimoramento das variedades de diferentes produtos”.
Renato Ishikawa explicou que, nos dias atuais, o agronegócio é o setor mais eficiente e bem sucedido no Brasil, representando mais de 30% do PIB (Produto Interno Bruto). “Neste cenário, um dos mais famosos Centros de Excelência localiza-se no Brasil central, na extensa região do Cerrado cuja exploração foi alavancada a partir de cooperação binacional por meio do projeto Prodecer – Programa de Cooperação Nipo-Brasileiro para o Desenvolvimento Agrícola dos Cerrados – iniciado em 1979.
Maçã – Ele citou ainda outros exemplos de Centros de Excelência liderados por nipo-brasileiros, com destaques para a produção de grãos, vegetais, hortigranjeiros e a fruticultura no Nordeste, no Sul e no Sudeste do país. Em relação à fruticultura, ressaltou a região de São Joaquim, no Estado de Santa Catarina, considerada a capital brasileira da maçã. “Na década de 70, a cooperação técnica com o Japão, por meio da Jica, foi decisiva para a aclimatação da maçã das variedades Fuji e Gala na região serrana. Hoje, o Estado de SC é responsável por mais de 75% da produção nacional, que está calculada em 1 ½ milhão de toneladas. O Brasil, que antes importador desta fruta, hoje é exportador”, destacou Ishikawa, que apontou ainda o exemplo de Tomé-Açu, berço da colonização japonesa no Estado do Pará, onde, a partir da década de 70, passou a ser desenvolvido o sistema agroflorestal de Tomé Açu, conhecida como Safta, com o plantio consorciado de diversas culturas agrícolas frutíferas preservando a floresta em substituição à monocultura de pimenta do reino.
Cinturões verdes – Outro ponto importante destacado por Renato Ishikawa foi a presença dos imigrantes japoneses a partir de 1970 no chamado cinturão verde em torno de centros urbanos do pais. “Nessas regiões houve ocupação intensiva de terras voltadas para a produção de variedade de produtos hortifrutis destinados ao abastecimento dos mercados locais”, salientou o presidente do Bunkyo, lembrando que, em 2009, a entidade criou um braço agrícola, o Bunkyo Rural, destinado a promover estudos e encontros visando aproximar os diversos setores relacionados a área rural, enfocando temas como produtividade tecnologia e condições de plantio”.
Diálogo – Para Takashi Yoshioka, o Brasil representa “um enorme mercado e uma grande fronteira de expansão de negócios para o Japão”. Segundo o conselheiro do MAFF, este ano, “em meio a disseminação da crise alimentar mundial desencadeada pela pandemia e a guerra na Ucrânia, as necessidades para a cooperação entre o Brasil, um grande país agrícola, e o Japão, o país a presidir o G7 deste ano com forte interesse e envolvimento sobre as questões alimentares, estão crescendo cada vez mais”.
Yoshioka disse que, com a posse de um novo governo no Brasil, “esperamos que a relação diplomática com o Japão seja ainda mais expandida tendo um novo começo na cooperação entre os dois países nos setores agrícola e alimentício”. “O Ministério da Agricultura, Florestas e Pesca vem mantendo um diálogo produtivo entre os ministros da Agricultura do Brasil e do Japão desde 2015, e pretendemos expandir a cooperação agrícola e melhorar o ambiente de negócios através de mais oportunidades como a de hoje”, disse ele, lembrando que, “acima de tudo, são mais de 100 anos de história da imigração japonesa no Brasil”. Ele também expressou “sinceras condolências pela morte do vice-presidente do Bunkyo, Marcelo Hideshima”, ocorrida no dia 1º de fevereiro.
Impostos e burocracia – A primeira parte do seminário discutiu as possibilidades de negócio para os alimentos japoneses com foco nas tendências do mercado brasileiro, no ambiente de distribuição de produtos alimentícios japoneses e nos desafios institucionais, por meio da apresentação de iniciativas de empresas japonesas e brasileiras. Participaram desta sessão Elisabete Miyako Itani, compradora de Importação da Comercial Marukai, que falou sobre a burocracia e as altas taxas sobre os produtos que tornam as importações um verdadeiro desafio para as empresas; Alberto Koga, diretor da Zendai; e o presidente da Associação Brasileira de Gastronomia Japonesa (ABGJ), Marcelo Shiraishi, que deu um panorama sobre a cadeia produtiva dos restaurantes japoneses e sobre os objetivos da ABGJ (promover, divulgar e fortalecer os restaurantes de culinária japonesa no Brasil; criar relacionamentos por toda a cadeia – do produtor ao cliente; ser um facilitador para toda a cadeia de restaurantes japoneses e criar ponte Brasil – Japão (conectar).
Construção recíproca – A segunda parte foi dedicada a um debate sobre como o Brasil e o Japão podem contribuir para questões globais como a crise alimentar e a produção agrícola sustentável e contou com a com a participação do ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, e o representante chefe do Escritório da Jica Brasil, Masayuki Eguchi, além de outros especialistas.
Rodrigues disse que, a relação entre o Brasil e o Japão na agricultura tem sido uma relação de construção recíproca. ‘Importante destacar que Japão e Brasil têm trabalhado em benefício próprio. No entanto, dada a difícil situação global, mais do que nunca, Japão e Brasil precisam trabalhar juntos, mas olhando agora para os outros países”, disse Rodrigues, acrescentando que em dez anos a oferta de alimentos precisa crescer 20%, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) com dados Fundação de Apoio Universitário (FAU).
Indutor da paz – “Para que o mundo cresça 20% na oferta de alimentos em 10 anos, o Brasil tem que crescer 40%”, explicou o ex-ministro, afirmando que o Brasil tem condições de ser o grande supridor de alimentos e, portanto, o indutor da paz. “A segurança alimentar não é uma questão meramente midiática. Ela é a única garantia de estabilidade social e política. Um país que tem fome não tem paz”, disse.
Sobretaxa – Para o deputado federal Kim Kataguiri, que prestigiou o evento a convite do presidente da ABGJ, Marcelo Shiraishi, o Seminário foi importante também para mostrar “tanto para o embaixador como para o cônsul geral, o quanto se consome em restaurantes japoneses aqui no Brasil e o quanto o brasileiro valoriza a cultura e a culinária japonesa”. “E para mostrar o quanto o Japão deveria voltar os seus olhos para essas parcerias econômicas com o Brasil”, disse o parlamentar ao Nippon Já.
Segundo ele, “existe, primeiro, uma sobretaxa em relação à importação de produtos japoneses que não faz o menor sentido porque não há uma indústria nacional nesse sentido a ser protegida”. “Ou seja, nós não produzimos os produtos que nós estamos importando do Japão para os restaurantes e para os mercados. Portanto, não faz sentido você praticamente dobrar ou triplicar o preço do produto até ele chegar aqui no Brasil”, conta, explicando que “tem uma questão burocrática também que precisa ser destacada junto ao Ministério da Fazenda e ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços que nós também devemos trabalhar dentro do Congresso Nacional”, afirmou Kim.
Primeiro passo – Ao jornal Nippon Já, o diretor da Jetro, Hiroshi Hara, afirmou que a agricultura é uma excelente oportunidade de retomar as relações entre os dois países, que ficou um pouco parada por conta da pandemia. “Nós, da Jetro, da Embaixada e do Consulado pretendemos trabalhar para fortalecer ainda mais essas relações e este Seminário representa um primeiro passo neste sentido”, afirmou Hiroshi Hara.
(Aldo Shiguti)